
O Distrito Federal, com uma população surda estimada em mais de 100 mil pessoas, segundo dados do IBGE, enfrenta desafios substanciais quando se trata de inclusão e acessibilidade. A Língua Brasileira de Sinais (Libras), reconhecida oficialmente como meio legal de comunicação no Brasil, ainda é subutilizada em diversos setores. O projeto Libras em Cena, financiado pelo Fundo de Apoio à Cultura (FAC) da Secretaria de Cultura e Economia Criativa do DF (Secec-DF), surge como uma tentativa de amenizar essa lacuna, capacitando produtores culturais para tornar eventos mais acessíveis.
Uma Ação Necessária, mas Insuficiente
Apesar da importância de iniciativas como o Libras em Cena, que busca integrar profissionais do setor cultural e a comunidade surda, essa ação levanta questões sobre o alcance limitado de medidas voltadas à inclusão. As oficinas, que ocorrem em outubro de 2024, pretendem capacitar profissionais para que eles possam incluir a Libras em suas produções culturais. No entanto, uma pergunta inevitável surge: quantos eventos culturais no DF realmente se comprometem com a acessibilidade plena para surdos, além de ações pontuais como esta? A inclusão verdadeira exige mais do que capacitar um grupo limitado de pessoas; é necessário garantir que essa prática se torne parte intrínseca do planejamento de qualquer evento ou serviço público.
A Desigualdade no Acesso aos Direitos Culturais
A cultura, que deveria ser um direito universal, permanece inacessível para a maioria da comunidade surda. A falta de intérpretes de Libras e o desconhecimento sobre a cultura surda por parte de muitos organizadores de eventos refletem um problema estrutural. O DF conta com a Central de Interpretação de Libras (CIL) e o aplicativo DF Libras Cil Online, que oferecem serviços de interpretação, mas isso não cobre a necessidade de intérpretes em atividades culturais, educacionais e cotidianas, onde o acesso à informação e ao entretenimento continua sendo um privilégio restrito aos ouvintes.
Essa desigualdade de acesso não é apenas uma questão de infraestrutura, mas de prioridade. Amarildo João, professor do Instituto de Letras da Universidade de Brasília (UnB) e um dos líderes do projeto, reforça a importância da contratação de profissionais capacitados em Libras em diversos campos, como educação, saúde e serviços públicos. Contudo, a realidade é que a inclusão das pessoas surdas muitas vezes fica relegada a iniciativas esporádicas, como oficinas ou eventos comemorativos, em vez de ser tratada como uma política pública contínua e abrangente.
A Ilusão da Inclusão Superficial
Embora a oferta de oficinas e cursos de Libras seja positiva, há um perigo real de que essas ações sejam vistas como suficientes para garantir a inclusão, criando uma falsa sensação de que o problema foi resolvido. A inclusão efetiva requer mudanças sistêmicas, como a obrigatoriedade da presença de intérpretes de Libras em todos os eventos públicos, escolas bilíngues em quantidade suficiente para atender a demanda, e uma conscientização mais ampla sobre a cultura surda em toda a sociedade.
Caminho Lento e Fragmentado
Enquanto o projeto Libras em Cena é um passo na direção certa, ele evidencia o quanto ainda estamos distantes de uma verdadeira inclusão. As pessoas surdas continuam enfrentando obstáculos significativos para exercer plenamente seus direitos, seja no acesso à educação, cultura ou serviços públicos. A capital do país, que deveria ser exemplo de inclusão, ainda patina em ações fragmentadas e insuficientes, deixando a população surda à margem de muitos espaços importantes da vida social.
A questão que permanece é: quando veremos uma mudança estrutural no tratamento da inclusão e acessibilidade? A acessibilidade precisa ser uma política de base, e não uma iniciativa esporádica ou uma prestação de contas burocrática.
Fonte: Agência Brasília
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